
Ao entrar em contato com as quatro formas de abordagem do tema "trabalho", percebi de início que delas poderia surgir uma linha de conexões.
A leitura do decreto-lei me levou a refletir acerca da irônica "obviedade" das relações de trabalho atuais.
Segundo o decreto, o salário mínimo deve ser "capaz de satisfazer, em determinada época e região do País, as suas necessidades [a dos trabalhadores] normais de alimentação, habitação, vestuário, higiene e transporte". E a ironia reside justamente aqui: quantos conseguem satisfazer essas necessidades com o que recebem de salário mínimo?
Esse pensamento me levou ao quadro de Portinari, o qual retrata de forma bastante emblemática o dia-a-dia de trabalhadores rurais na colheita de café. O que dizer sobre a "contraprestação" mínima desses trabalhadores? O que recebem muitas vezes não lhes permite ao menos almejar novos horizontes, que dirá satisfazer suas necessidades.
Acredito que essa imagem não esteja tão distante de nossos dias, uma vez que cada vez mais trabalhadores deixam de buscar o algo além do mínimo, esse algo necessário e fundamental para a valorização de seu trabalho e que lhe permitirá trilhar novos caminhos.
Trilhar novos caminhos, sair do lugar onde se encontra, buscar o melhor. Nesse sentido recorro à descrição física de trabalho publicada no
wikipedia: trabalho requer 2 elementos para ser produzido: força e deslocamento. Não bastando, claro, que esses dois elementos coexistam para que o trabalho exista, eles devem estar numa mesma direção.
Apesar de estarmos lidando com uma lei física, o conceito de trabalho pode ser transposto para outro sentido de trabalho: o de realizar alguma atividade obtendo-se uma remuneração mínima para tanto. Quero dizer que não basta somente termos força para exercermos o trabalho se não a aplicarmos numa direção coerente. Da mesma forma que sem força ou sem um plano de deslocamento estaremos lidando com uma situação contraproducente e sem sentido!
Exemplo disso encontramos na letra de Construção, de Chico Buarque, onde em sua segunda parte o autor traz a historia de um trabalhador "desregulado", sem um deslocamento planejado e sem organizações de suas forças, destinadas a propósitos outros que não os de seu trabalho.
Trazendo a discussão do tema "trabalho" para minha área de estudo, a Fonoaudiologia, posso dizer que essa palavra é muito preciosa e bastante usada em minha prática clínica e acadêmica. Isso porque a todo instante estamos
trabalhando algum aspecto relacionado a comunicação, ou estamos atentas aos acidentes e intercorrências decorrentes da prática de
trabalho de nossos pacientes (a fim de prevenir e também reabilitar, especialmente na área de audiologia); muitas vezes somos convidadas por nossas supervisoras a dizer às crianças em atendimento: "vamos
trabalhar isso hoje" ao invés de "hoje vamos brincar disso". É importante que nossos pacientes entendam que nossos atendimentos são um conjunto de força [do terapeuta e deles] direcionada e somada a um deslocamento em busca do objetivo traçado para cada um deles.
Tudo isso faz com que vários estigmas da fonoaudiologia sejam dissipados, entre eles o de que apenas brincamos em terapia e de que não temos um campo vasto de atuação [vide possibilidade de atuar em empresas e centros de atenção à saúde do trabalhador].
Além do mais, estudar sempre é um trabalho, no sentido mais amplo e completo do termo, uma vez que empregamos força [física e de vontade!] em busca de uma contraprestação, seja ela a satisfação de conhecer e aprender, seja o recebimento de bolsas de estudo, seja porque vamos utilizar o conhecimento adquirido em algum ambiente de trabalho financeiramente remunerado.
Isso posto, posso dizer que na Fonoaudiologia há, sim, muito trabalho!!